sexta-feira, 16 de junho de 2017

Carta de um desesperado




Fortaleza, 16 de junho de 2017.


Estou só. Fui colocado nesta situação injustamente, não fui eu quem o matou, nem tão pouco deixei-me levar pelo ódio que guardava comigo por todos os anos que convivemos juntos.
O conheci desde o seu nascimento, torcia que ele chorasse brandamente no dia em que a sua mãe lhe deu a luz. E ele chorou, esbravejou, avermelhou-se de tanto chorar. Mas ainda assim segurei o seu ímpeto desejo de gritar por horas.
Ele não sabia disso até bem pouco tempo atrás, mas por muitas vezes fiz papel de razão mesmo sendo a emoção. Quantas ciladas amorosas, quantos sustos na vida e eu ali, junto a ele. Se, pelo menos, ele me visse ou sentisse como eu o sinto, por Deus ele saberia o quanto queria ser seu amigo.
Amizade, que coisa mais idiota ele pensa que é. Não soube escolher direito. Bem que os outros avisavam, viam, mas ele, não sei bem o motivo, só escolhia andar em más companhias. Pobre coitado e agora? Onde estão os seus amigos?
Eu bati para chamar a sua atenção. O fiz soar frio, provoquei náuseas, falei com os outros: “Vamos derrubá-lo agora senão será nosso fim”. Mas os outros, nem ligavam muito, pareciam felizes com o rumo que as coisas estavam tendo.
E agora que o fim chegou? O cara lá de cima não responde mais. Muitos já foram, só resta a mim ficar vendo a sua agonia. Pequenos espasmos, respiração muito ofegante e nada mais. Aquele barulhão de outrora fez com que seu corpo nem reagisse mais a nenhum estímulo.
Espero que, ao final de tudo, me tirem daqui e eu possa recomeçar em outro ambiente. Mas ele é tão pobre de espírito que nem a minha doação indicou.
Estou cansado, não sei se vou suportar por mais tempo. Em fim, vou para de bater. Adeus.

PS: Se eu ainda estiver vivo quando me encontrarem, por favor encontrem alguém que queria me ter como um novo coração.

quarta-feira, 7 de junho de 2017

E quando o orgulho aparece

Você então está atarefado e seu filho lhe pede ajuda para escrever uma pequena redação para a escola. Abruptamente você deixa as suas coisas e vai falar para ele que uma redação se divide basicamente em três partes: Introdução, desenvolvimento e desfecho.

Sem muitas delongas, mas com outras pequenas dicas o fato é passado. Algum tempo depois, para um outro exercício, o filho agora apenas pede algo para lhe inspirar. Digo que ele deve escrever algo que ele sinta. Subindo as escadas, parece que levou consigo a dica do seu pai a ferro e fogo. Minutos após, um grito perguntando em que parte da Bíblia está a passagem do Bom Samaritano. Antes que a resposta fosse dada, vem a confirmação de que o texto foi encontrado através da internet.

Minutos, talvez horas depois, o menino desce já arrumado para ir para a escola. Em suas mãos um caderno com a folha surrada e um pequeno texto escrito, o título? "Respeito ao próximo." Sem nenhuma ideia de como era o texto, o pai pega aquele caderno e vai lendo. E a medida que os olhos avançam na leitura, os olhos enchem-se de lágrimas, as pernas tremem, a respiração fica ofegante e uma pergunta é feita: "Foi você que escreveu isso?" Incerto da reação do pai, o menino, desconfiado, olha para baixo e responde que sim.

"Que coisa maravilhosa meu filho!" O sorriso conquistado do pai é o pagamento pelo esforço evidenciado pelos amassados da folha do caderno na luta do menino em escrever algo para a escola. Na escola seu texto é lido e é dito que é muito bom. Mas, para os pais, é excelente.

Entrando em contato com o jornal O Povo em Fortaleza-CE, o texto é enviado sem muitas pretensões. Algumas semanas depois, um e-mail avisa que o texto será publicado. E hoje, dia 07 de Junho de 2017, seu pai, exibe orgulhosamente, o tal texto - editado sim para atender ao limite do jornal, mas a essência, contendo a pregação sobre o Bom Samaritano está ali.

Obrigado meu filho Rafael. Se Deus me levasse hoje, fique sabendo que você me encheu de orgulho - sempre.